domingo, 12 de outubro de 2025

Reinício diplomático ou trégua tensa? Brasil e EUA buscam reequilíbrio em momento delicado

Imagem de Arquivo: Bandeirinhas do Brasil e EUA 

Por Marcelo Procópio 

Geopolítica: Nas últimas semanas, o cenário das relações Brasil-Estados Unidos tem sido marcado por uma mistura de atritos, recuos diplomáticos e tentativas de reconciliação. O telefonema amistoso entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump, a imposição de tarifas e sanções pela administração norte-americana, e a disposição de os representantes dos dois países se encontrarem pessoalmente revelam uma nova fase — cheia de expectativas e riscos — nas relações bilaterais.


A escalada dos atritos

Em meados de julho de 2025, o governo dos EUA impôs severas tarifas a produtos de origem brasileira, chegando a 40 % adicionais sobre uma série de exportações, que se somaram a uma alíquota recíproca de 10 %, gerando uma carga tributária total de até 50 % para itens brasileiros no mercado estadunidense. 

Além disso, autoridades norte-americanas revogaram vistos de ministros do Supremo Tribunal Federal, acusando-os de envolvimento em decisões que, segundo Washington, ferem a liberdade de expressão e os princípios democráticos — alegações que foram recebidas pelo Brasil como ingerência externa. 

Em meio a esse clima tenso, surgiram movimentos diplomáticos para evitar que a crise se torne irreversível: o governo brasileiro contratou escritório jurídico nos EUA para reverter sanções, iniciou estudo de medidas recíprocas com base na lei de reciprocidade, e convocou sua estrutura diplomática a dialogar com o governo Trump. 



O telefonema entre Lula e Trump e o novo tom do diálogo

Em 6 de outubro de 2025, os presidentes Lula e Trump mantiveram uma videoconferência de cerca de 30 minutos, classificada por ambos como cordial e produtiva. Lula usou a oportunidade para solicitar a retirada das tarifas adicionais e a reversão das sanções a autoridades brasileiras. Trump, por outro lado, disse que ambos “irão se sair muito bem juntos”, em referência a uma suposta retomada de cooperação em comércio e política internacional. 

Logo após esse contato, o Brasil e os EUA concordaram em realizar uma reunião bilateral em Washington entre o chanceler brasileiro Mauro Vieira e o secretário de Estado Marco Rubio. O encontro tem como objetivo tratar, sobretudo, das disputas comerciais e tarifárias. 

A analista Kellie Meiman Hock, da McLarty Associates, observou que o mais importante nessa fase será definir claramente o escopo das negociações — ou seja, quais temas serão prioritários e quais serão mantidos fora da mesa. 


Opiniões de cientistas políticos: riscos e motivações

Para especialistas em Relações Internacionais e Ciência Política, os movimentos recentes entre Brasília e Washington revelam tanto oportunidades quanto armadilhas.

O professor Oliver Stuenkel, da FGV, aponta que a postura de sanções e retaliações dos EUA tem potencial de fortalecer a unidade entre países emergentes frente às pressões ocidentais — um efeito paradoxal que pode reforçar alianças entre nações como os integrantes do BRICS. 

Já alguns analistas britânicos na London School of Economics alertam que o Brasil está servindo como “laboratório” para uma nova forma de intervencionismo dos EUA — que combina medidas econômicas, diplomáticas e de força normativa para moldar comportamentos de grandes democracias sem apelar ao confronto explícito. 

Esses estudiosos sugerem que uma aproximação pragmática será fundamental para evitar escaladas: que o Brasil preserve sua soberania e sistema institucional ao mesmo tempo em que negocie concessões em áreas estratégicas, como comércio, investimentos e tecnologia.



Expectativa de empresários e políticos brasileiros

Do lado empresarial, setores exportadores veem a sinalização de retomada diplomática com cautelosa esperança. Exportadores de commodities, produtos agrícolas e itens manufaturados aguardam condições mais claras — especialmente a reversão das tarifas — para planejar investimentos internacionais e restaurar cadeias de produção afetadas.

Para políticos, o momento representa chance de recompor pontes com a maior potência global e reabilitar a confiança em alianças estratégicas. Em discursos públicos, o senador Chico Rodrigues defendeu que o momento de crise deve ser aproveitado para elevar o protagonismo brasileiro no setor mineral e tecnológico, destacando que o país não pode mais ser tratado como mero fornecedor periférico. 

No Congresso, já se discute mudança no marco regulatório dos minerais críticos, que poderiam alavancar o valor agregado das exportações brasileiras e reforçar o peso negociador do país. 


Limites e desafios — o que ainda está em jogo

Mesmo com sinais de reconciliação, vários fatores podem limitar o avanço real:

Resistências internas nos EUA: a ala republicana mais dura pode pressionar Trump e Rubio a manter postura firme, dificultando concessões.

Temas sensíveis fora da pauta comercial, como decisões judiciais brasileiras, regulação de redes sociais e política interna, podem virar pontos de conflito nas negociações.

Credibilidade e fidelidade às instituições brasileiras: qualquer sinal de capitulação ou interferência será alvo de críticas internas, especialmente se a sociedade enxergar risco à independência do Judiciário.

Tempo e paciência diplomática: o desgaste acumulado exige que soluções sejam encontradas de modo gradual, sem rupturas abruptas que provoquem retrocessos.

Para que a retomada nas relações gere ganhos concretos — e não apenas retórica diplomática — será necessário equilíbrio entre pragmatismo e defesa dos interesses nacionais.

O recente reatamento entre Brasil e Estados Unidos passa por uma encruzilhada: um momento delicado em que gestos simbólicos — como o telefonema entre Lula e Trump — podem abrir caminho para negociações efetivas, mas a profundidade dessa nova fase dependerá de concessões mútuas bem calibradas.

Se bem conduzida, a aproximação pode restabelecer confiança, gerar estabilidade para o setor exportador e fortalecer o protagonismo brasileiro no cenário global. Se mal conduzida, pode gerar desconfiança interna e alimentar narrativas de fragilidade diplomática.


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Divulgação:






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