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| Sem o presidente da Câmara Hugo Motta, jantar de Arthur Lira, Guilherme Derrite e Eduardo Cunha expõe fragilidade na Câmara - reprodução |
Por Cleide Gama
Brasília: O deputado Guilherme Derrite (PP-SP) apresentou nesta terça-feira (18) a quinta versão do substitutivo do PL Antifacção, após uma série de críticas de especialistas, do governo federal e de órgãos de segurança pública. A constante mudança no texto tem sido vista por analistas como um indício de improvisação legislativa e manobras para favorecer determinados interesses — o que tem aumentado a desconfiança sobre a condução do projeto dentro da Câmara dos Deputados.
Disputa por recursos: PF em alerta
Um dos pontos mais controversos dizia respeito ao destino dos bens apreendidos de facções e milícias. O texto anterior distribuía parte desses valores para fundos estaduais, o que, segundo a Polícia Federal, diminuiria o financiamento da instituição no combate ao crime organizado.
Embora Derrite tenha mantido a regra de que o dinheiro “retorna ao ente que realizou a investigação”, ele alterou novamente o destino dos recursos quando houver participação da PF: antes destinada ao Funapol, agora a verba irá para o Fundo Nacional de Segurança Pública.
A mudança só ocorreu após reportagens apontarem que a proposta inicial poderia causar impacto negativo nas contas públicas, o que levantou suspeitas sobre falta de planejamento e articulação.
Endurecimento penal e polêmicas
O novo relatório traz penas de 20 a 40 anos para integrantes de facções ou milícias, podendo chegar a 66 anos para líderes. Também impede graça, indulto, anistia e liberdade condicional. A progressão de regime passa a exigir 85% da pena — uma das propostas mais duras da legislação penal brasileira.
Críticos, porém, apontam que o endurecimento extremo não vem acompanhado de políticas de prevenção, inteligência ou estrutura prisional para lidar com facções já dominantes nos presídios. Segundo especialistas, o projeto “soou mais como uma resposta política imediatista do que como uma solução eficaz”.
Perdimento de bens antecipado
Outra crítica do governo federal foi corrigida: antes, o Estado só poderia assumir bens ilícitos após o fim da ação penal — o que poderia demorar anos.
Agora, Derrite retomou a previsão do projeto original, permitindo perdimento na fase de inquérito, desde que a origem lícita não seja comprovada e exista risco de dissipação do patrimônio.
O relator também reforçou que medidas administrativas da Receita Federal e do Banco Central continuam valendo, evitando brechas para que bens fossem recuperados por criminosos durante o processo.
Manobras políticas e desgaste
A indicação de Derrite — que se licenciou da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo apenas para relatar o PL — já havia causado desconforto no governo. Ele foi acusado de tentar limitar a atuação da Polícia Federal, ao exigir autorização formal de governadores para investigações federais. Após pressão e acusações de “interferência indevida”, o trecho foi retirado.
Mesmo assim, especialistas alertam que as sucessivas alterações demonstram “falta de coerência técnica” e refletem uma tentativa de setores da Câmara de ampliar o controle político sobre investigações de combate às facções.
Risco à autonomia do Ministério Público
Juristas também criticaram dispositivos que poderiam restringir investigações conduzidas diretamente pelo MP. Após repercussão negativa, Derrite incluiu texto garantindo a participação do Ministério Público em forças-tarefas, inclusive por meio dos GAECOs.
Apesar da mudança, professores de Direito afirmam que o substitutivo ainda deixa brechas interpretativas que podem ser usadas para contestar investigações futuras.
“Organização criminosa ultraviolenta”: risco de caos jurídico
Mesmo diante de críticas, Derrite manteve a criação da figura de organização criminosa ultraviolenta. Especialistas alertam que um novo tipo penal, com definições abertas e sobrepostas às já existentes, pode gerar insegurança jurídica e até beneficiar réus em tribunais superiores.
Audiência de custódia por vídeo e julgamento por colegiado
O texto propõe que audiências de custódia sejam realizadas prioritariamente por videoconferência, sob argumento de reduzir gastos com escolta — uma medida criticada por quem defende a análise presencial para evitar abusos.
Outra mudança é que homicídios cometidos por facções sejam julgados por um colegiado judicial em primeira instância, e não pelo júri. A justificativa é proteger jurados de ameaças, mas especialistas apontam que a medida pode abrir precedentes para fragilizar o Tribunal do Júri em outros casos.
Cresce a percepção de improviso e estratégias políticas
Entre idas e vindas, ajustes de última hora e forte apoio do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), o PL Antifacção se tornou palco de disputas políticas, interesses regionais e conflitos entre instituições. Para críticos, o texto final — apesar de mais robusto — ainda carrega sinais de um projeto acelerado para dar “resposta política” ao crime organizado, mas sem o devido debate técnico.
A votação está prevista para ocorrer ainda nesta terça-feira (18) no plenário da Câmara.
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